1808 by Laurentino Gomes

1808 by Laurentino Gomes

Author:Laurentino Gomes [Gomes, Laurentino]
Language: por
Format: epub, mobi
Tags: História do Brasil
Publisher: Planeta
Published: 2011-09-22T14:40:02+00:00


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O CHEFE DA POLÍCIA

Uma bomba populacional abalou o Rio de Janeiro nos treze anos em que a corte portuguesa esteve no Brasil. O número de habitantes, que era de 60000 em 1808, tinha dobrado em 1821. Só São Paulo, transformada na maior metrópole da América Latina na fase da industrialização, na primeira metade do século XX, veria um crescimento tão acelerado. No caso do Rio de Janeiro, havia um agravante: metade da população era escrava.1 Pode-se imaginar o que foi isso numa cidade que já em 1808 não tinha espaço, infra-estrutura nem serviços para receber os novos moradores que chegavam de Lisboa.

A criminalidade atingiu índices altíssimos. Roubos e assassinatos aconteciam a todo momento. No porto, navios eram alvos de pirataria. Gangues de arruaceiros percorriam as ruas atacando as pessoas a golpes de faca e estilete. Oficialmente [pág.

228] proibidos, a prostituição e o jogo eram praticados à luz do dia.

“Nesta cidade e seus subúrbios, temos sido muito insultados pelos ladrões”, relata o arquivista real Luiz Joaquim dos Santos Marrocos numa das cartas ao pai, que ficara em Lisboa. “Em cinco dias, contaram-se em pequeno circuito 22 assassinatos, e numa noite defronte à minha porta fez um ladrão duas mortes e feriu um terceiro gravemente.”2 Marrocos reclamava que havia negros e pobres em demasia nas ruas do Rio de Janeiro e que a maioria se vestia de forma indecorosa.

A tarefa de colocar alguma ordem no caos foi confiada por D.

João ao advogado Paulo Fernandes Viana. Desembargador e ouvidor da corte, nascido no Rio de Janeiro e formado pela Universidade de Coimbra, Viana foi nomeado intendente geral da polícia pelo alvará de 10 de maio de 1808, cargo que ocupou até 1821, o ano de sua morte. Tinha funções equivalentes ao que seria hoje a soma de um prefeito com um secretário de Segurança Pública. Mais do que isso, era “um agente civilizador” dos costumes no Rio de Janeiro.3 Cabia a ele transformar a vila colonial, provinciana, inculta, suja e perigosa em algo mais parecido com uma capital européia, digna de sediar a monarquia portuguesa. Sua missão incluía aterrar pântanos, organizar o abastecimento de água e comida e a coleta de lixo e esgoto, calçar e iluminar as ruas usando lampiões a óleo de baleia, construir estradas, pontes, aquedutos, fontes, passeios e praças públicas. Ficou também sob sua responsabilidade policiar as ruas, expedir passaportes, vigiar os estrangeiros, fiscalizar as condições sanitárias dos depósitos de escravos e providenciar moradia para os novos habitantes que a cidade recebeu com a chegada da corte.4

[pág. 229]

Viana era um dos mais influentes auxiliares do príncipe regente, com quem tinha audiências a cada dois dias.5 Afirmava ser

“um dever da polícia trazer o povo entretido e promover o amor e respeito dos vassalos para com o soberano e sua real dinastia”.6

Munido de superpoderes, ele se metia em praticamente tudo. Brigas de família e vizinhos, confusões envolvendo escravos e senhores, organização de festas e espetáculos públicos, distribuição de livros e jornais estrangeiros, o comportamento das pessoas dentro e fora de casa — nada escapava de seu crivo.



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